Serie De Ficção Cientifica Brasileira: A nossa vida é repleta de magia quando entendemos, e unimos a nossa sincronicidade com o todo. “A Harpa Sagrada” inicia-se numa serie de revelações onde o homem tem sua essência cravada no sagrado, e o olhar no cosmos aspirando sua perfeição.

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

O premiado matemático Marcelo Viana fala sobre Teoria do Caos

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 (Foto: ANA BRANCO/O GLOBO)
Se o caos é mesmo um fenômeno furioso, como afirma o poeta Fernando Pessoa, então o matemático carioca Marcelo Viana conseguiu domá-lo como ninguém. A dedicação aos estudos voltados para a evolução de sistemas de comportamento caótico lhe rendeu, em maio, o Grand Prix Scientifique Louis D., principal prêmio científico da França. O diretor do Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA) divide a honraria com o francês François Labourie, da Universidade de Nice, e mais 14 pesquisadores franceses e brasileiros que, apesar do oceano de distância, trabalham em conjunto — e em surpreendente organização, dado o objeto de estudo.
“O Brasil é um grande parceiro da França na matemática”, explica Viana. “Isso se desenvolveu nos anos 1980, quando os franceses podiam trocar o serviço militar por trabalho social aqui no Impa. Por serem vagas disputadas, durante muito tempo, a gente recebeu os melhores matemáticos de lá.”
Ao encontrar uma lógica no que parece não haver nenhuma, a equipe de Viana e Labourie conseguiu fazer com que, pela primeira vez, um prêmio da Academia de Ciências da França fosse dado a um estudo matemático. “A matemática é uma ciência evidentemente importante, mas ela é pequena, se comparada com a saúde, por exemplo. Isso em todos os países”, afirma Viana. “Mas acredito que o nosso projeto é bom, e isso deve se destacar em termos de qualidade e impacto.”
À GALILEU, o matemático refletiu o espírito de Chico Science e mostrou que desorganizando é, de fato, possível organizar. Ele explicou melhor sobre a pesquisa e só se esquivou na hora de aplicar o conceito do estudo ao confuso sistema político brasileiro — que é muito mais caótico do que a Teoria do Caos.
Quando se fala em Teoria do Caos, lembramos de filmes como Efeito Borboleta e De Volta Para o Futuro. Acha que eles representam bem o conceito?
Representam, mas são muito simplistas. É que nem a Lei de Murphy: são leis que dizem muito pouca coisa. Dizer que o bater de asas de uma borboleta no Brasil pode causar um furacão no Texas é legal, mas e daí? O que você faz com essa informação? Não é útil, porque você não sabe se tem borboleta ou não, se vai bater a asa ou não. Agora, se disser que, apesar do sistema ser complicado, é possível prever com probabilidade de tantos porcento a umidade do tempo daqui a cinco meses na região, aí você terá uma informação útil. O que o Efeito Borboleta constata é: isso não é muito simples de analisar porque pequenas causas podem ter efeitos enormes.
Por que matemáticos não gostam do termo “Teoria do Caos”?
Porque é uma expressão usada de maneira muito vaga, e matemáticos são obcecados por precisão. A gente fala mais em “sistemas caóticos” só para evitar ambiguidades mesmo.
As pessoas também associam o termo “caos” a algo ruim, tem uma conotação negativa. Isso faz sentido na matemática?
Tem razão, é parte do porquê a gente evita a expressão. “Caos” é interpretado como desordem, uma bagunça completa. Mas o que a gente foi descobrindo ao longo das últimas décadas é que esses sistemas de comportamento caótico têm regras e eles podem ser entendidos, desde que você use a linguagem certa.
E o que seria essa linguagem certa? 
Um exemplo muito simples: quando você joga uma moeda no ar, você não sabe se vai dar cara ou coroa. É um processo aleatório, porque o resultado é imprevisível. Mas mesmo não sendo capaz de prever, se a moeda for honesta, uma moeda equilibrada, você pode garantir que, a longo prazo, mais ou menos 50% das vezes vai ser cara e 50% vai ser coroa.
O que a gente descobriu no estudo dos sistemas com comportamento caótico é algo parecido com isso: você não pode prever individualmente como o sistema vai evoluir dessa condição inicial, mas pode dar uma informação estatística, em que 30% do tempo será dessa forma, 20% será de outra forma. Ou seja, a palavra “caos” dá essa ideia de imprevisibilidade, mas, na verdade, você pode dizer sobre estes sistemas, desde que se use a linguagem de probabilidade, a linguagem de médias, de porcentagens.
E isso é bastante útil. Se você quer investir seu dinheiro em uma plantação, por exemplo, e souber que há 80% de chance de chover no próximo mês, você pode se sentir mais à vontade para gastar seu dinheiro. Se tem 78% de probabilidade de nevar, você não investe. É uma informação que tem muito valor.
E qual é o foco do estudo que ganhou o prêmio?
É o seguinte: você escreve a equação do fenômeno que quer estudar. Mas como se estuda essa equação? Tem que ter métodos para isso. Fizemos várias coisas nesse sentido, uma delas foi introduzir ferramentas que permitem estuda-las. A outra foi comprovar a existência de alguns fenômenos que só existiam na nossa imaginação. Falei do Atrator de Lawrence, e tem outro atrator famoso, o de Hénon, que é um objeto que você pode mandar um computador desenhar, um atrator caótico. Mas será que é mesmo caótico ou só parece e não é? Provei que há uma grande abundância de sistemas em que existem de fato esses fatores estranhos.
Na física, há a busca por uma teoria perfeita que unifique toda a natureza, a Teoria de Tudo. Esse estudo de sistemas caóticos entra em conflito com essa ideia?
Certamente, não. Mais correto que falar em contradição seria dizer que a teoria dos sistemas caóticos é uma parte necessária nessa Teoria de Tudo. Ela não basta porque os sistemas da mecânica quântica são diferentes, esses próprios sistemas são aleatórios. Mas a teoria dos sistemas caóticos é um passo necessário para construir essa Teoria do Tudo que os físicos buscam há a algumas décadas.
E o senhor acredita na possibilidade da Teoria de Tudo?
Eu sou otimista, mas aí é uma resposta que não é de cientista, é pessoal. Claro que os físicos sempre devem se apoiar em experimentos, mas o modo como a física tem evoluído tornam difícies de realizá-los. Então, eles se apoiam na intuição matemática, olhando as fórmulas e  vendo quais são as mais elegantes. E uma das coisas mais fascinantes da natureza é que as fórmulas matemáticas mais elegantes, mais simétricas, são as mais corretas. É uma coisa extraordinária.
Há um episódio muito interessante com Einstein, por exemplo. Ele estava buscando a fórmula da Teoria da Relatividade Geral, que relaciona a matéria com o espaço, e ele não tinha como fazer experimentos para testar essa teoria. Então, ele se correspondia diariamente com o matemático alemão David Hilbert. Nas correspondências, a gente vê que o critério que eles utilizavam era "essa fórmula não dá porque ela não é muito simétrica, não é muito bonita". Eles estavam buscando a fórmula perfeita, até que Einstein parou de escrever, não falou uma palavra para o Hilbert e uma semana depois publicou o artigo com a fórmula que usamos até hoje, com a equação de campo de Einstein, que é uma das fórmulas fundamentais da ciência, que é muito bonita. Tanto Einstein com seu espírito científico teórico quanto Hilbert, que era um grande matemático, estavam buscando a verdade, buscando a beleza, o equilíbrio, a elegância matemática. E isso é o modo como a física teórica tem evoluído nos últimos anos.
O senhor acredita que esses estudos de sistemas caóticos poderiam ser aplicados na política brasileira hoje?
[Risos] Infelizmente, temas como política e economia são sistemas de outro tipo. A evolução deles lida com um fluxo de informação que afeta o modo como o sistema evolui. Se você sabe que as ações da Petrobras vão despencar amanhã, você vende. Têm agentes humanos, atores inteligentes que processam a informação, e isso cria um comportamento muito mais difícil de analisar. É uma das áreas nas quais já houve progresso, a Teoria dos Jogos é um progresso nessa direção, mas não temos uma teoria matemática adequada para descrever sistemas com atores inteligentes.

Revista galileu.

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