Capítulo 05 B – OS GUARDIÕES DO GRAAL
Filho do lendário herói judaico rei David, o também rei Salomão construiu um templo de inigualável beleza em Jerusalém, usando os mais belos e os mais dispendiosos materiais. Mármore e pedras preciosas, madeiras aromáticas e os mais finos panos foram empregados para criar um lugar que fizesse os sentidos dos crentes transbordar de deleite e também onde o próprio deus se sentisse na sua própria casa. Na parte mais central do templo, encontrava-se o santo dos santos, onde o sumo-sacerdote podia receber o “todo-poderoso” através do mais misterioso dos instrumentos, a Arca da Aliança.
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Capítulo 05 B – OS GUARDIÕES DO GRAAL – Livro “The Templar Revelation –Secret Guardians of the True Identity of Christ” de Lynn Picknett e Clive Prince.
CAPÍTULO 5-B – OS GUARDIÕES DO GRAAL
Este instrumento, muito temperamental, letal e perigosíssimo, era conhecido, por um lado, por conferir grandes bênçãos aos «justos» e, por outro, por destruir os malfeitores ou aqueles que não sabiam combater ou se proteger contra os efeitos da sua presença sinistra. Para os Templários, talvez ela parecesse a arma fundamental, e partiram, portanto, para a encontrar, como tem sido sugerido.
Existem, talvez, indicações, na decoração das catedrais, do que os Templários acreditavam ser o significado da «Arca». Por exemplo, a catedral de Chartres, produto do gênio da sua eminencia (dos Cavaleiros Templários) parda, Bernardo de Clairvaux, contém uma escultura em pedra que parece representar a Virgem Maria, com o «rótulo» gravado: arcis foederis – Arca da Aliança. Em si mesmo, isto não é importante, porque era um símbolo clássico cristão da era medieval. Mas, como Chartres era um centro de culto da Madona Negra, estaria a Arca sendo comparada àquela outra Maria, Madalena, ou mesmo a uma deusa pagã, muito mais antiga?
Talvez seja o próprio princípio feminino que está sendo mais uma vez evocado, sob a «cobertura» do símbolo católico mariano. Não pode ser uma referência à própria Virgem, porque os arquitetos das catedrais medievais tinham uma razão especial para evocar o arquétipo de uma mulher sexualmente ativa. (Também é significativo que as primeiras representações da lenda de Maria Madalena em França se encontrem nos vitrais da Catedral de Chartres.)
E, de fato, a muito difamada e mal interpretada disciplina da alquimia a inspiradora das decorações, aparentemente bizarras, dos edifícios góticos (porque, na verdade, era a simbologia da alquimia que parecia ser o denominador comum da maioria dos grão-mestres do Priorado de Sião).
Pensa-se que a alquimia veio dos egípcios, via árabes (a própria palavra deriva do árabe). Era mais do que ciência: a prática abrangia uma delicada teia de atividades interligadas e modos de pensamento, desde a magia à química, desde a filosofia e o hermetismo até à geometria sagrada e à cosmologia. Também se interessava pelo que, atualmente, se chama engenharia genética e por métodos de retardar o envelhecimento e por tentar alcançar a imortalidade física.
Os alquimistas eram ávidos de conhecimento e não tinham tempo para o antagonismo da Igreja em relação à experimentação; por isso, ocultaram-se e continuaram as suas investigações em segredo. Para os alquimistas, não existia heresia – ao passo que para a Igreja não existia um alquimista não herético; por isso, toda a prática alquímica se tornou conhecida por Arte Negra.
A alquimia tinha muitos níveis: o exterior, ou exotérico, estava relacionado com o trabalho e as experiências com metais, mas havia outros níveis, sucessivamente mais secretos, que incluíam a realização da misteriosa «Grande Obra». Esta era interpretada como o momento culminante da vida de um alquimista, quando ele transforma, finalmente, o “vil metal em ouro”.
Contudo, nos círculos esotéricos, ele também é considerado o momento em que o alquimista se torna espiritualmente iluminado e fisicamente revitalizado – através de um «trabalho» mágico que gira em volta da sexualidade (n.t. ativação e elevação da Kundalini, através dos sete chakras…). (Esta questão será discutida pormenorizadamente, mais tarde). Parece que o Grande Trabalho, a Grande Obra alquímica, como uma metáfora, representava um ato de suprema iniciação.
Talvez se pensasse que este rito conferia longevidade. Dizia-se que Nicolas Flamel, alegadamente grão-mestre do Priorado de Sião, realizara a Grande Obra acompanhado por sua mulher, Perenelle, a 17 de Janeiro de 1382, e depois vivera durante um tempo excepcionalmente longo.
Na alquimia, o símbolo da Grande Obra completada é o hermafrodita – literalmente, o deus Hermes (Thoth) e a deusa Afrodite fundidos numa só pessoa. Leonardo ficou fascinado com os hermafroditas, a ponto de encher folha após folha do seu bloco de papel de esboços com desenhos deles – alguns pornográficos. E o estudo recente do mais famoso retrato do mundo – a Mona Lisa do sorriso enigmático – mostrou, de forma convincente, que a imagem «dela» não era outra senão a do próprio Leonardo.
Os investigadores Dr. Digby Quested do Maudsley Hospital de Londres e Liliam Schwartz dos Bell Laboratories dos EUA. usaram as mais sofisticadas técnicas de computador, independentemente um do outro, para ajustar o rosto do retrato com o rosto do artista, e o resultado foi um ajustamento perfeito. Talvez fosse apenas uma das suas inteligentes “brincadeiras” feitas à posteridade, mas também existe a possibilidade de que Leonardo, sendo um alquimista, estivesse a encerrar numa cápsula a sua ideia de ter realizado a “Grande Obra” alquímica. (n.t. fato que ficou registrado no sudário de Turim, com a impressão da imagem de Leonardo no tecido).
Algumas pessoas pensam que esta realização podia provocar uma transformação física tão profunda que o alquimista de sucesso podia mesmo mudar de sexo – talvez fosse este o conceito que inspirou a Mona Lisa. Mas o símbolo do hermafrodita também representa o momento do orgasmo, quando os participantes masculino e feminino do rito experimentam a sensação de se fundirem um no outro, ultrapassando os seus próprios limites e atingindo um conhecimento místico de si mesmos e do Universo.
As catedrais góticas ostentam muitas figuras curiosas, desde demônios até ao Homem-Verde. Mas algumas são extraordinariamente estranhas: uma gravura da Catedral de Nantes representa um homem a olhar para um espelho, mas a parte posterior da cabeça é, de fato, a de um homem velho. E, em Chartres, a chamada gravura da «rainha de Sabá» exibe, efetivamente, uma barba. Os símbolos alquímicos encontram-se em muitas catedrais que estão associadas aos Cavaleiros Templários.
Estes elos de ligação são implícitos, mas Charles Bywaters e Nicole Dawe descobriram lugares templários do Languedoc-Roussillon com símbolos alquímicos explícitos: A nossa investigação mostrou, entre outras coisas, que eles estavam muito familiarizados com as propriedades do solo. Numa determinada área, criaram um hospital para os Templários que regressavam da Terra Santa, porque o solo tinha propriedades terapêuticas. Existem sinais alquímicos nesse lugar…
É muito claro que eles estavam familiarizados com a alquimia. É significativo quando encontramos uma localização especialmente escolhida devido à natureza do solo, onde existem claros sinais alquímicos na estrutura e onde existem ligações com os cátaros e os muçulmanos. É uma evidência sólida e documentada; é muito fácil de provar.
Durante as nossas viagens em França, verificamos repetidamente que cidades que foram antigamente propriedade templária – como Utelle na Provença e Alet-les-Bains, no Languedoc – se tornaram, subsequentemente, centros de estudos da alquimia. Também é importante que os alquimistas, como os Templários, tivessem uma veneração especial por João Batista.
Como vimos, as grandes catedrais e muitas igrejas famosas foram construídas em lugares conhecidos por terem sido consagrados a antigas deusas. Por exemplo, Notre Dame de Paris ergueu-se dos alicerces de um templo de Diana, e St. Sulpice, em Paris, foi construída sobre as ruínas de um templo de ÍSIS. Em si, isto não é invulgar porque, em toda a Europa católica, as igrejas foram construídas em antigos lugares de cultos pagãos, como uma atitude deliberada por parte da Igreja para mostrar que triunfara sobre os pagãos.
Mas, muitas vezes, o que realmente aconteceu foi que os habitantes locais apenas adaptaram a sua forma de paganismo para incluir o catolicismo e consideraram o lugar da nova igreja como complementar da Antiga Religião, mais do que antagônico.
No entanto, dada a prova dos interesses mais profundos dos Templários, não poderia ser, no caso das catedrais, que elas se destinassem a continuar o culto do feminino no divino, mais do que a suprimi-lo? Talvez as catedrais fossem hinos à deusa, esculpidos em pedra, e a «Notre Dame», a quem tantos deles eram devotados, fosse realmente o próprio princípio feminino da divindade – a Sophia, a deusa…
Atualmente, a maioria das pessoas considera a arquitetura (exterior) gótica como sendo muito «masculina», com as suas elevadas espirais e as naves em forma de cruz, mas a maior parte da decoração interior é sutilmente feminina, especialmente as esplêndidas rosáceas. Barbara G. Walker mostra a importância de:
[…] a Rosa, que os antigos romanos conheciam pela Flor de Vênus, essa flor era o distintivo das prostitutas sagradas. Palavras proferidas «ao abrigo da rosa» (sub rosa) faziam parte dos mistérios sexuais de Vênus, não podiam ser reveladas aos não-iniciados […] Na grandiosa era da construção das catedrais, quando Maria era venerada como deusa, nos seus «Palácios de rainha do Céu», ou Notre Dame, ela era evocada como a Rosa, a Roseira, a Grinalda de Rosas… a Rosa Mística. Como um templo pagão, a catedral gótica representava o corpo da deusa, a qual era também o seu Universo, contendo no seu interior a essência do masculino […]
A rosa, como veremos, foi também o símbolo adotado pelos trovadores, os cantores das canções de amor do Sul da França, que estavam intimamente ligados aos mistérios eróticos, outros símbolos, encontrados nas catedrais góticas, transmitem fortes mensagens subliminares relativas ao poder do Feminino.
Teias de aranha esculpidas na pedra – uma imagem repetida na cúpula da clarabóia da igreja de Notre-Dame de França, em Londres – representam Aracne, a deusa-aranha que rege o destino do homem, ou ÍSIS, no seu papel de fiandeira do destino. Igualmente o grande dédalo ou labirinto, desenhado no pavimento da Catedral de Chartres, remete para os mistérios femininos através dos quais o iniciado pode encontrar o seu caminho, seguindo o fio que a deusa fiou para ele.
Este lugar (a Catedral de Chartres) não se destina ao louvor da Virgem Maria, particularmente porque ela também contém uma Madona Negra – Notre Dame de Souterrain (Nossa Senhora do Mundo Inferior). Também em Chartres existe um vitral que representa Maria Madalena chegando no sul da França, de barco, combinando, assim, uma referência desta lenda com a de ÍSIS, para quem este era também um meio de transporte favorito. [Talvez o título de Nautonnier (timoneiro) dos grão-mestres do Priorado remeta para o seu suposto papel no Barco de ÍSIS.] Esta janela é a mais antiga representação da lenda de Madalena NA França, e, numa catedral, a tantas milhas de distância da Provença, certamente os arquitetos a consideraram de grande importância.
Ao mesmo tempo que se construíam as catedrais, a heresia encontrou uma outra expressão, assegurando, deste modo, que a sua mensagem ficaria na história – embora, como A Última Ceia de Leonardo, os códigos através dos quais ela encontrou expressão sejam, por vezes, mal interpretados. Esta outra tradição herética era a lenda do Graal.
Atualmente, o termo Santo Graal é usado para designar um alvo elusivo, o galardão brilhante que coroará o trabalho de toda uma vida. A maioria das pessoas compreende que ele se refere a uma coisa mais antiga, de natureza religiosa – geralmente, a taça por onde Jesus bebeu na Última Ceia. Segundo uma lenda, José de Arimateia, o amigo rico de Jesus, recolheu nele o sangue derramado na Crucificação, que se verificou, nessa altura, ter propriedades curativas.
A demanda do Santo Graal é interpretada como uma expedição cheia de perigos físicos e espirituais, porque aquele que o procura luta com toda a espécie de inimigos, incluindo os do domínio sobrenatural. Em todas as versões da história, a taça é um objecto literal e um símbolo da perfeição. Considera-se que ele representa algo que, ao mesmo tempo, pertence a duas dimensões – a real e a mítica – e, como tal, nunca nada prendeu tanto a imaginação.
O Graal pode ser considerado um objeto misterioso, um verdadeiro tesouro que existe algures, em alguma caverna, mas contém sempre a ideia implícita de que simboliza algo de inefável, transcendente que ultrapassa a vida de todos os dias. Esta aura de demanda espiritual surgiu não só das lendas originais do Graal mas também da cultura em que elas floresceram.
Dos milhões de palavras que têm sido escritas sobre este tema, ao longo dos séculos, na nossa opinião, algumas das mais judiciosas encontram-se em The Holy Grail de Malcolm Godwin, publicado em 1994. É uma síntese notável de todas as lendas e interpretações díspares e que, através da verbosidade, têm a percepção exata do âmago da questão. Além dos habituais elementos cristãos e célticos dos romances do Graal do fim do século XII – princípio do século XIII, Godwin também identifica um terceiro elemento, igualmente importante – o alquímico.
Este autor revela que as primeiras versões da história do Graal se inspiraram em mitos célticos que envolviam os feitos do grande herói rei Arthur e da sua corte, e muitos elementos destes contos centravam-se em conceitos de culto de deusas célticas (do feminino divino). As histórias do Graal redefiniram as velhas lendas célticas e ampliaram-nas para incluir ideias heréticas, que eram correntes no século XIII.
O primeiro dos romances do Santo Graal foi O Romance do Graal (c. 1190), a obra incompleta de Chrétien de Troyes. É significativo que a cidade de Troyes, cujo nome Chrétien adotou como apelido, fosse um centro cabalístico e o lugar do primeiro preceptorado templário – e era ali que o notável cavaleiro templário conde de Champagne reunia a sua corte. (Na verdade, a maioria dos nove Templários originais eram seus vassalos.) E a mais famosa igreja de Troyes é dedicada a … Maria Madalena. Na versão de Chrétien, não há qualquer referência ao Graal como sendo uma taça nem qualquer ligação com a última Ceia ou com Jesus, explicitamente descrita.
De fato, não existe nenhuma conotação religiosa óbvia, e tem-se afirmado que, se alguma existe, é distintamente pagã. Aqui, o objeto, denominado Graal, era uma escudela ou um prato – o que, como veremos, é muito significativo. De fato, Chrétien inspirara-se num conto celta muito mais antigo que tem como herói Peredur, cuja aventura envolveu o encontro com uma macabra procissão, aparentemente muito ritualista, num castelo remoto. Transportadas nesta procissão, entre outras coisas, contavam-se uma lança que gotejava sangue e uma cabeça decepada colocada numa escudela.
Um traço comum às histórias do Graal é o momento crítico, em que o herói se esquece de fazer uma pergunta importante, e é esse o pecado de omissão que o arrasta para um perigo grave. Como escreve Malcolm Goddwin:
«Aqui a pergunta, que não foi feita dizia respeito à natureza da cabeça. Se Peredur tivesse perguntado de quem era a cabeça, teria sabido como levantar o encantamento da Terra Árida» (A terra fora amaldiçoada e tornada árida.)
Mesmo incompleta, a história de Chrétien foi um enorme sucesso e deu origem a um grande número de histórias do mesmo gênero – a maioria das quais era explicitamente católica. Mas, como afirma Malcolm Godwin, referindo-se aos trovadores que as escreveram:
Eles conseguiram envolver uma obra da mais profunda heresia num mistério tão piedoso que tanto a lenda como os autores sobreviveram ao ardente fanatismo dos padres da Igreja.
As mentes ortodoxas da Roma papal, apesar de nunca reconhecerem, de fato, a existência do Graal, foram também surpreendentemente tímidas para o condenar… E o mais estranho é que a lenda não foi corrompida pela queda dos cátaros heréticos… nem mesmo dos Cavaleiros Templários, que, implicitamente, figuram em vários textos.
Uma dessas versões cristianizadas foi Perlesvaus, que foi escrita, dizem, por um monge da abadia de Glastonbury, c. 1205, enquanto outros acreditam que foi obra de um Templário anônimo. Esta história é relativa a duas demandas, que estão interligadas. O Cavaleiro Gawain procura a espada que decapitou João Baptista e que, magicamente, sangra todos os dias ao meio-dia. Num dos episódios, o herói encontra uma carroça com 150 cabeças de cavaleiros decapitados: algumas estão seladas em ouro, algumas em prata e outras em chumbo. Há também uma estranha donzela que leva numa mão a cabeça de um rei selada em prata e, na outra, a de uma rainha selada em chumbo.
Em Perlesvaus, os servidores de elite do Graal usam vestes brancas, adornadas com uma cruz vermelha – exatamente como os Templários. Há também uma cruz vermelha que se ergue numa floresta e que é vítima de um sacerdote que lhe bate «em toda a parte» com uma vara, um episódio que tem uma clara conotação com a acusação de que os Templários cuspiam e pisavam a cruz. De novo, há uma curiosa cena que envolve cabeças decepadas. Um dos guardiões do Graal diz ao herói Perceval:
«Há cabeças seladas em Prata e cabeças seladas em chumbo, e os corpos a que essas cabeças pertencem: digo-te que tens de separar dentre elas a cabeça do rei (o princípio masculino) e a da rainha (o princípio feminino).»
O simbolismo alquímico é abundante: metais vis e preciosos, reis e rainhas. Estas imagens também se encontram em profusão noutras adaptações importantes da lenda do Graal, como veremos. Apesar da tácita antipatia da Igreja pelo Graal, a versão mais cristianizada foi, de fato, escrita por um grupo de monges de Cister. Chamada Queste del San Graal, ele é mais notável pelo fato de o Cântico dos Cânticos ser a fonte do seu poderoso simbolismo místico.
De todas as histórias do Graal francamente bizarras, a mais misteriosa – e a mais provocadora – é Parcifal (c.1230) do poeta bávaro Wolfran von Eschenbach. Nela, o autor afirma que está deliberadamente a corrigir a versão de Chrétien de Troyes, que não continha toda a informação disponível. Alega que a sua versão é mais exata porque obtivera a verdadeira história através de um certo Kyot de Provença – que tinha sido identificado como Guiot de Provins, um monge que era uma expressão da Ordem dos Templários e um trovador.
Como Wolfran diz em Parcifal: «A verdadeira história, com a conclusão do romance, fora enviado da Provença para terras alemãs.» Mas o que era esta importante conclusão? Em Parcifal, o Castelo do Graal era um lugar misterioso, guardado pelos Templários (que, de modo significativo, Wolfran chama «homens batizados»), que são enviados para espalharem a sua fé em segredo. Segredo e a aversão do Grupo do Graal a ser interrogado são realçados.
No fim da história, Repanse de Schoye (a portadora do Graal) e o meio-irmão de Parcifal, Fierefiz, partem para a Índia e têm um filho chamado João – o famoso Prestes João -, que é o primeiro de uma linhagem que toma sempre o nome João… Poderia isto ser uma referência codificada ao Priorado de Sião, cujos grão-mestres, supostamente, adotam sempre este nome?
E o conceito de linhagem que é central para as teorias de Baigent, Leigh e Lincoln relativamente ao Graal. Como indica o título do seu primeiro livro, para eles, o «Santo Graal» era, de fato, o «Sangue Real Divino», baseado na ideia que o original francês sangraal. geralmente entendido como san graal (Santo Graal), devia ser corretamente interpretado como sang real – o sangue real, que eles interpretaram como uma descendência sanguínea, uma linhagem sagrada.
Baigent, Leigh e Lincoln relacionaram a importância que as lendas do Graal dão à linhagem com o que eles acreditam ser o grande segredo sobre Jesus e Madalena terem sido marido e mulher e surgiram com a sua própria teoria: o Graal das lendasera uma referência simbólica aos descendentes de Jesus e de Maria Madalena. Segundo esta teoria, os guardiães do Graal eram aqueles que conheciam esta linhagem sagrada e secreta – como os Templários e o Priorado de Sião.
Mas esta idéia apresenta uma dificuldade: nas histórias do Graal, a ênfase é na linhagem dos guardiães do Graal ou dos que encontram o Graal: o Graal, em si mesmo, é distinto deles. Apesar de ser possível que as lendas se refiram a um segredo guardado por certas famílias e passado de geração em geração, parece improvável que elas aludam realmente a uma descendência sanguínea. Afinal, a idéia surge da fixação numa simples palavra francesa – sangraal – e já vimos as dificuldades que surgem de uma hipótese que assenta na ideia da manutenção de uma descendência «pura» ao longo dos tempos.
A ligação entre as histórias do Graal e a herança dos Templários parece bastante real. Wolfran von Eschenback. segundo se pensa, viajou muito e não desconhecia os centros Templários do Médio Oriente, e o seu conto é, de longe, o mais explicitamente templário dos romances do Graal. Como escreve Malcolm Godwin: «Ao longo de Parcifal, Wolfran intercala o relato com alusões a astrologia, alquimia, à cabala e às novas ideias espirituais do Oriente.» Também inclui simbolismo óbvio, colhido no Tarot.
É na sua versão que os guardiões do Graal, no castelo de Montsalvach, são explicitamente chamados Templários. O castelo original fora identificado comMontségur, a última fortaleza importante dos cátaros – e, notavelmente, noutro dos seus poemas, Wolfran chama Perilla ao senhor do castelo do Graal. O verdadeiro senhor de Montségur, na época do poeta, era Ramon de Perella. Mais uma vez, vemos os Templários e os cátaros associados uns aos outros e a um tesouro mal definido mas muito valioso.
Na versão de Wolfran não há nenhuma taça dotada de poderes sobrenaturais; aqui, o Graal é uma pedra – lapsi exillis – que talvez signifique a Pedra da Morte, embora isto seja mera especulação. Ninguém, de fato, sabe. Segundo outras explicações, a pedra é uma jóia que caiu da coroa de Lúcifer quando ele desceu do céu à Terra, e a famosa Pedra Filosofal (lapis elixir) dos alquimistas. Neste contexto, a última interpretação é a mais verosímil: o texto, no seu todo, é rico em símbolos alquímicos.
Alguns escritores consideraram que a figura de Cundrie, a «mensageira do Graal» no Parsifal, representava Maria Madalena. (Certamente que Wagner a considerou como tal – na sua ópera Parsifal (1882), a sua Kundry traz um frasco de bálsamo e lava os pés do herói, os quais ela, como Madalena, enxuga com o seu cabelo.) Talvez haja alguma ressonância da taça do Graal no jarro de alabastro de Madalena na iconografia cristã tradicional.
Em todas as histórias, no entanto, a demanda do Graal é uma alegoria da jornada espiritual do herói em direção – e para além – da transformação (evolução espiritual) pessoal. E, como vimos, uma das motivações principais de todos os verdadeiros alquimistas era precisamente essa.
Mas foi apenas o seu subtexto alquímico que tornou «heréticas» todas as lendas do Graal?
Sem dúvida que a Igreja ficou mortalmente ofendida pela maneira como as histórias do Graal ignoraram ou renegaram a sua autoridade e a da sucessão apostólica. O herói agia sozinho – embora, ocasionalmente, com auxiliares – na busca da iluminação e da transformação espirituais. Assim, na essência, as lendas do Graal são textos gnósticos acentuando a responsabilidade do indivíduo pelo estado EVOLUTIVO da sua alma.
Há, no entanto, muito mais para ofender as sensibilidades da Igreja romana e que está implícito em todas as histórias do Graal. Porque a experiência do Graal é inevitavelmente apresentada como estando reservada apenas aos grandes iniciados – a nata da elite -, algo que ultrapassa mesmo a transcendência da missa. Além disso, em todas as histórias do Graal, o próprio objeto – seja ele qual for – é guardado por mulheres.
Mesmo na história céltica de Peredur, os jovens podem empunhar a lança mas são as donzelas que transportam o que se pode chamar o protótipo do Graal – a escudela com a cabeça. Mas que faziam as mulheres ao assumirem um papel de tanta autoridade numa coisa que era, efetivamente, uma forma superior de missa? (Lembremos que os cátaros, cuja cidadela e fortaleza de Montségur foi, quase certamente, o modelo do Castelo do Graal de Wolfran, promoviam um sistema de igualdade entre os sexos, de modo que tanto homens como mulheres podiam ser chamados «sacerdotes».)
Mas é a ligação com os Templários que mais impregna as história do Graal. Como observaram diversos comentadores, a acusação de que os cavaleiros veneravam uma cabeça decepada – que se julgava chamar Baphomet – tem ressonâncias com os romances do Graal, nos quais, como vimos, figuram largamente cabeças decepadas. Os Templários foram acusados de atribuir poderes semelhantes aos do Graal a este Baphomet: fazia florescer as árvores e tomava a terra fértil. De fato, os Templários não só foram acusados de reverenciar esta cabeça-ídolo como também possuíam um relicário em prata, com a forma de uma caveira feminina, que era designada apenas por caput (cabeça).
Hugh Schonfield, ao considerar as implicações desta cabeça feminina, juntamente com a sua «descodificação» de Baphomet como Sophia, escreve:
Pareceria haver poucas dúvidas de que a cabeça da bela mulher, pertencente aos Templários, representava a SOFIA (Sabedoria), no seu aspecto feminino e de ÍSIS, e estava associada a Maria Madalena na interpretação cristã.
As relíquias dos Templários têm a fama de terem incluído o (suposto) indicador direito de João Baptista, o que pode ser mais importante do que parece. Como vimos no Capítulo I, Leonardo representava figuras de cenas religiosas apontando para cima, deliberada e ritualisticamente com o indicador direito, e este gesto parece ter estado relacionado com João Batista. Por exemplo, vimos que um indivíduo que parecia estar a venerar a alfarrobeira na Adoração dos Magos estava a fazer este gesto: tanto a árvore como o gesto estão associados a João.
A relíquia, considerada ter sido propriedade dos Templários, pode ter sido a razão material de Leonardo ter aderido a estas imagens.(Jacobus de Voragine, em Golden Legend, relata uma tradição segundo a qual o dedo de João Batista – a única parte do corpo decapitado que escapou à destruição ordenada pelo imperador Juliano – foi trazido para França por Sta. Tecla, portanto, talvez haja razão para acreditar que a relíquia dos Templários e a da lenda fossem uma e a mesma relíquia. E De Voragine também registra que, segundo a lenda, a cabeça de Batista foi enterrada debaixo do Templo de Herodes, em Jerusalém, onde os Templários fizeram escavações).
Os Templários são continuamente associados ao Graal. A escritora de viagens britânica Nina Epton, em The Valley of Pyrene (1955), descreve a sua subida às ruínas do castelo dos Templários de Montréal-de-Sos, no Ariège, para observar os murais que representam uma lança com três gotas de sangue e um cálice – uma imagem claramente inspirada nas lendas do Graal.
Outros graffiti bizarros foram encontrados no castelo de Domme, onde muitos Templários estiveram prisioneiros. Ean e Deike Begg descrevem uma estranha cena da Crucificação, a qual representa José de Arimateia (tendo na mão uma cruz de Lorena), à direita, recolhendo gotas do sangue de Jesus. À esquerda, vê-se uma mulher nua, grávida, tendo na mão uma vara ou um bastão.
Há outros elos de ligação mais curiosos. Em St. Martin-du-Vésubie, na Provença, que, como vimos, é um lugar famoso de culto a Madona Negra e dos Templários, existe uma lenda que reúne interessantes elementos das histórias do Graal. Diz-se que os Templários daquele local foram todos decapitados durante a repressão – o que, dada a completa falta de verificação oficial, parece altamente improvável – e que eles amaldiçoaram a terra. Os homens tornaram-se impotentes ou estéreis e a terra árida. Qualquer que seja a verdade da questão, é um fato histórico que, em 1560, o duque Emmanuel Filibert de Sabóia mandou exorcizar a terra, porque ela se encontrava num estado lastimável.
De fato, um dos montes vizinhos ainda é conhecido por Maledia (de modo geral, traduzido por «doença»). Mas a parte mais significativa desta triste história é a que associa a decapitação dos Templários com uma maldição sobre a terra – dois elementos essenciais do cânone do Graal. Para os autores das histórias do Graal, havia alguma coisa relacionada com cabeças decapitadas, ou, talvez, com uma cabeça decapitada, que lançou a maldição sobre a terra mas que também podia oferecer abundância àqueles que ela favorecia.
As diferentes histórias do Graal e os vários elementos que elas contêm podem parecer confusos, mas no seu estudo monumental das lendas do Santo Graal, The Hidden Church of the Holy Grail (1902), o grande erudito ocultista A. E. Waite discerniu a presença de uma tradição secreta no seio do cristianismo, que inspirou todo o conceito das lendas. Waite foi um dos primeiros a reconhecer os elementos alquímicos, herméticos e gnósticos das histórias. Embora estivesse certo de que há fortes sugestões da existência dessa «igreja oculta» nas lendas do Graal, ele não chega a qualquer conclusão definitiva relativa à sua natureza, mas dá um lugar importante ao que ele designou por «Tradição Joanina».
Ele refere-se a uma antiga ideia dos círculos esotéricos, relativa a uma escola mística do cristianismo, que foi fundada por João (o discípulo amado) Evangelista baseada nos ensinamentos secretos que ele recebera de Cristo, através de Jesus. Este conhecimento arcano não surgia no cristianismo externo ou exotérico que proveio dos “ensinamentos” de Pedro e Paulo. Notavelmente, Waite considera que esta tradição chegou à Europa, via sul da Gália – o Sul da França – antes de se infiltrar na primitiva Igreja Céltica da Bretanha.
Apesar dos elementos célticos das histórias do Graal, Waite considera a sua influência joanina como oriunda do Médio Oriente, via Templários. Habilmente, ele não a declara a única ligação possível, porque não há provas conclusivas dela, mas admite que seja a mais plausível. No entanto, ele está certo de que os romances do Graal se basearam em qualquer gênero de «igreja (conhecimento-Sofia) oculta» que estava relacionado com os Templários.
A insistência de Waite numa tradição «joanina» foi um tanto desesperante – ele não a desenvolveu e a sua fonte permanece envolta em mistério. Mas, claramente, ela pareceu oferecer um elo de ligação potencialmente excitante entre as histórias do Graal e um S. João – aquele que, como veremos no próximo capítulo, viria dar sentido a muita da aparente confusão que rodeia esta questão.
As histórias do Graal são ainda outra manifestação das idéias secretas que circulavam na França medieval sob os auspícios dos Templários, como o culto da Madona Negra. A ligação entre os dois é notável. Ambos são baseados nos primitivos temas pagãos: as histórias do Graal baseadas em mitos célticos e o culto da Madona Negra baseado nos santuários de deusas pagãs. Contudo, ambos floresceram nos séculos XII e XIII, devido ao contato – via Templários – com a “Terra Santa”.
Os Templários eram um repositório de conhecimento colhido em muitas fontes esotéricas, incluindo as da alquimia e da sexualidade sagrada. [A ligação entre as Madonas Negras, os Templários e a alquimia é o tema de um estudo do historiador francês Jacques Huynen, em L’énigme des Vierges Noires (O Enigma das Virgens Negras) (1972).] E a «ponte» entre as idéias exóticas e esotéricas dos Templários e o mundo católico da sua época estava personificada na imagem de uma mulher: Maria Madalena.
Tudo isto aconteceu há muito tempo. Há muito que os cátaros desapareceram. e a Ordem do Templo foi extinta não muito tempo depois. Mas este conhecimento secreto, esta consciência mística e alquímica do Feminino, também está enterrado sob a poeira dos séculos?
Talvez não. Talvez se tenha tornado o mais excitante e mais perigoso segredo mantido vivo no mundo secreto da Europa atual.
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