Capítulo 2B – No MUNDO SECRETO:
Há razões, no entanto, para tirar partido de paradoxos – mesmo dos absurdos gritantes. Temos tendência a lembrar o absurdo, e, mais, as incongruências, que são deliberadamente apresentadas como fatos escrupulosamente muito bem argumentados e têm um efeito estranhamente poderoso sobre a nossa mente inconsciente. Afinal, é esta parte de nós que cria os sonhos que funcionam com o seu tipo próprio de paradoxo e de não-lógica. E é a mente inconsciente que é o motivador, o criador que, uma vez «em movimento», continuará a trabalhar, mesmo sobre a mensagem mais subliminar, durante anos. extraindo o último pedaço de significado simbólico de uma pequena migalha de aparente engodo.
Edição e imagens: Thoth3126@gmail.com
Capítulo 02 B- NO MUNDO SECRETO – Livro “The TEMPLAR REVELATION – Secret Guardians of the True Identity of Christ” de Lynn Picknett e Clive Prince.
CAPÍTULO II B- NO MUNDO SECRETO (continuação)
Os céticos, que se orgulham, em geral, do seu discernimento material, são, por vezes, de fato, estranhamente ingênuos – porque eles vêem todas as coisas como sendo completamente brancas ou pretas, verdadeiras ou falsas, que é exatamente o modo como certos grupos querem que eles as vejam e aceitem. (n.t. e muitos, a maioria aceita como realidade aquilo que o paradigma DIZ QUE É REALIDADE). Por exemplo, qual é o melhor meio de atrair a atenção, por um lado, mas afastar os intrusos indesejados ou os curiosos fortuitos, por outro lado, do que apresentar ao público informação, aparentemente, intrigante mas também virtualmente absurda?
E como se a própria aproximação aos verdadeiros objetivos do Priorado constituísse, de fato, uma iniciação: se eles não nos são destinados, a cortina de fumaça impedir-nos-á efetivamente de fazer uma investigação mais profunda. Mas se, de algum modo, nos estiverem destinados, em breve receberemos esse material extra ou descobriremos por nós próprios, de uma maneira suspeitosamente sincrônica, esse conhecimento extra da organização que, subitamente, fará com que tudo se encaixe no seu lugar.
Na nossa opinião, é um grande erro ignorar os Arquivos Secretos apenas porque a sua mensagem explícita é manifestamente implausível. O simples volume do trabalho que implicam argumenta em favor de terem alguma coisa a oferecer. Manifestamente, muitos obsessivos desequilibrados gastaram todo o seu tempo num trabalho vasto e (aparentemente) inútil e o total homem/horas implicado nele, por si mesmo, não torna os resultados mais dignos da nossa admiração ou respeito. Mas aqui estamos lidando com um grupo que está claramente preparando um plano intrincado e, considerado em conjunto com todas as outras indicações e pistas disponíveis (que, a seu devido tempo, se tornarão evidentes), é claro que alguma coisa se passa, algo esta acontecendo. Ou eles estão tentando dizer-nos alguma coisa ou estão tentando esconder alguma coisa – enquanto continuam a dar a entender a importância do seu significado.
Assim, como devemos interpretar as reivindicações históricas do Priorado de Sião? Remonta realmente ao século XI e as suas fileiras incluíram, de fato, todos os nomes ilustres revelados nos arquivos secretos? Em primeiro lugar, pode dizer-se que há sempre um problema na comprovação da existência, atual ou histórica, de uma sociedade secreta. Afinal, quanto mais secreta ela tenha conseguido manter-se mais difícil é de comprovar a sua existência. Contudo, onde se possa provar terem existido repetidos interesses, temas e objetivos, entre os que se supõe terem pertencido a este grupo, ao longo dos anos, é seguro e mesmo sensato admitir que este grupo possa, de fato, ter existido.
Por inverosímil que possa parecer a relação dos grão-mestres do Priorado (indicada nos arquivos secretos), a investigação de Baigent, Leigh e Lincoln provou que esta não é uma lista feita ao acaso. Na verdade, existem ligações convincentes entre os sucessivos grão-mestres. Além de se conhecerem uns aos outros – e, em muitos casos, terem relações de parentesco -, estes luminares partilhavam certos interesses e preocupações. Sabe-se que muitos deles estavam associados a movimentos esotéricos e a outras “sociedades secretas”, como os (não tão secretos…) maçônicos, os rosacrucianos e a Companhia do Santo-Sacramento, e todos eles partilhavam alguns objetivos comuns. Por exemplo, há um tema, caracteristicamente hermético e ocultista, que percorre toda a literatura conhecida destas sociedades – um sentimento de verdadeiro entusiasmo pela perspectiva de o homem se tornar quase divino, no incessante alargamento dos limites do seu conhecimento que lhe proporcionará a EVOLUÇÃO.
Além disso, a nossa investigação independente, que foi apresentada no nosso último livro, confirmou que estes indivíduos e famílias, alegadamente implicados no caso do Priorado, ao longo dos séculos, foram também os mesmos inspiradores que apoiaram o que podia ser designado como a Grande Mistificação do Santo Sudário.
Como já vimos, tanto Leonardo como Cocteau empregaram simbolismo heterodoxo nas suas pinturas, supostamente católicas. Separadas por quinhentos anos, as suas imagens revelam considerável consistência – e, na verdade, outros escritores e artistas, que também estavam ligados ao Priorado, também introduziram estes motivos nas suas produções. Em si, isto sugere insistentemente que eles, de fato, faziam parte de um gênero de movimento secreto organizado que já estava bem implantado mesmo na época de Leonardo. Como ambos, ele e Cocteau, têm sido apontados como seus grão-mestres, e se considerarmos as suas preocupações comuns, parece razoável concluir que eles foram realmente membros da alta hierarquia de algum grupo, no mínimo, muito semelhante ao Priorado de Sião.
O conjunto de argumentos reunidos por Baigent, Leigh e Lincoln, em The Holy Blood and The Holy Grail, em defesa da existência histórica do Priorado, é irrefutável. E mais provas – que foram reunidas por outros investigadores – foram publicadas na edição revista e atualizada de 1996 do livro destes três autores. (Este livro é uma leitura essencial para quem se interesse por este tipo de mistério).
Todos estes argumentos mostram que havia uma sociedade secreta que atuava desde o século XII – mas é o atual e moderno Priorado de Sião o seu verdadeiro descendente? Apesar de os dois grupos poderem não estar necessariamente ligados. como se alega, certamente, o moderno Priorado tem conhecimento interno da sociedade histórica. Afinal, foi apenas por intermédio dos atuais membros que, pela primeira vez, ouvimos falar do passado do Priorado.
Mas mesmo o acesso aos arquivos do velho Priorado não implica necessariamente uma genuína continuação. Numa conversa recente com o artista francês Alain Féral – que, como protegido de Cocteau, trabalhou com ele e o conhecia muito bem -, ele afirmou-nos peremptoriamente que o seu mentor não fora grão-mestre do Priorado de Sião. Pelo menos, assegurou-nos Féral, Cocteau não estivera implicado na mesma organização que, há muito, reclamava Pierre Plantard de Saint-Claire como seu grão-mestre. Contudo, Féral levou a cabo a sua própria investigação de certos aspectos da história do Priorado de Sião, especialmente os aspectos relativos à aldeia de Rennes-le-Château, no Languedoc, e, na sua opinião, os que figuram nos Arquivos Secretos como grão-mestres, até, e incluindo, Cocteau, estavam ligados por uma genuína tradição secreta.
Nesta fase da nossa pesquisa, decidimos ignorar as supostas ambições políticas do moderno Priorado e concentrarmo-nos nos seus aspectos históricos, que podiam, evidentemente, lançar alguma luz sobre as primeiras. Os arquivos secretos – à parte a sua mitomania merovíngia – dão grande ênfase ao Santo Graal, à tribo de Benjamim e à personagem do novo Testamento, Maria Madalena. Por exemplo, em Le serpent rouge surge esta declaração:
“Daquela que desejo libertar, chegam até mim os aromas do perfume que impregna o sepulcro. Antigamente alguns invocavam-na, ÍSIS, rainha das fontes benéficas. VINDE A MIM TODOS OS QUE SOFREM E ESTÃO OPRIMIDOS E EU VOS CONFORTAREI“. Outros: MADALENA, do famoso vaso de unguento balsâmico. Os iniciados sabem o seu verdadeiro nome: NOTRE DAME DES CROSS.
Esta curta passagem é confusa, não apenas porque a última frase – Notre Dame des Cross – não faz qualquer sentido (a não ser que «Cross» seja um nome de família e, nesse caso, ela tornar-se-ia apenas um pouco mais inteligível). «Des» é a forma plural de «de», mas cross nem existe em francês e está no singular, em inglês. Há também a confusão peculiar (n.t. para os neófitos) de ÍSIS com Maria Madalena – afinal, uma era uma deusa e a outra «uma mulher perdida» e são figuras de culturas diferentes, sem qualquer ligação aparente.
Podíamos pensar, evidentemente, que há um problema imediato em ligar temas,aparentemente tão diferentes, como Madalena, o Santo Graal e a tribo de Benjamim – para não falar de ÍSIS, a deusa-mãe egípcia – com o da descendência merovíngia. Os Arquivos Secretos explicam que os francos sicambros, a tribo da qual descendiam os merovíngios, eram de origem hebraica, eram descendentes da tribo perdida de Benjamim, que emigrou para a Grécia e, depois, para a Alemanha, onde se transformou nos sicambros.
Contudo, os autores de The Holy Blood and The Holy Grail complicaram ainda mais o cenário. Segundo eles, a importância da geração merovíngia não era apenas um sonho fantástico de um pequeno grupo de realistas excêntricos. As suas pretensões transpuseram toda a questão para uma esfera muito diferente – a esfera que prendeu a imaginação de milhares de leitores entusiásticos do livro. Eles alegaram que Jesus fora casado com Maria Madalena e que havia descendência dessa união. Jesus (o Cristo) sobreviveu à cruz, mas a sua mulher partiu sem ele, quando levou os filhos para uma colônia judaica, fundada no que é o atual (e antigamente) Sul da França. Foram os seus descendentes que se tornaram a família reinante dos sicambros, fundando, assim, a dinastia real merovíngia.
Esta hipótese pode parecer explicar os principais temas do Priorado, mas levanta as suas próprias interrogações. Como vimos, é impossível que qualquer linhagem sobreviva na forma «pura» necessária para apoiar semelhante campanha, independentemente de quem os sicambros descendiam.
É inegável que há bons argumentos a favor de Jesus ter sido casado com Maria Madalena – ou, pelo menos, de algum tipo de relação íntima com ela – que, mais tarde, discutiremos em pormenor, e mesmo de ele ter sobrevivido à Crucificação. De fato, apesar da crença popular em contrário, nenhuma destas alegações depende da obra de Baigent, Leigh e de Lincoln, tendo sido minuciosamente discutidas por vários acadêmicos, muitos anos antes da publicação de The Holy Blood and The Holy Grail.
Há, contudo, um grande problema nas hipóteses que sustentam os seus argumentos – um problema de que eles estão manifestamente conscientes, embora evitem chamar a atenção para ele. Para eles, os merovíngios são importantes porque são os descendentes de Jesus O CRISTO. Mas, se ele sobreviveu à cruz, não podia ter morrido. Pelos nossos pecados, não podia ter ressuscitado – e, por conseguinte, não era divino, não era o Filho de Deus. Então, podíamos perguntar, por que eram os seus alegados descendentes considerados tão importantes.
Uma pessoa que faz parte deste santo grupo de descendentes julgava-se ser o próprio Pierre Plantard de Saint-Clair. Apesar da linguagem empolada usada pelos comentadores em torno desta hipótese, o próprio Plantard nunca alegou ser descendente de Jesus. Nunca é de mais insistir que não é a ideia cristã de que Jesus era Deus encarnado – e, por conseguinte, os seus descendentes eram, de algum modo, também divinos – que dá à ideia da sucessão merovíngia a sua alegada importância. A base de toda esta crença é que, como Jesus era da descendência de David e, por conseguinte, o legítimo rei de Jerusalém, este título recai automaticamente, mesmo que só em teoria, sobre a sua futura família. Assim, é político, mais do que divino, o poder que se reclama para a ligação merovíngia.
Baigent, Leigh e Lincoln, manifestamente, construíram a sua teoria sobre as reivindicações apresentadas nos Arquivos Secretos, mas, na nossa opinião, eles foram um tanto seletivos ao decidirem qual destas reivindicações deviam citar como prova. Por exemplo, os Arquivos Secretos afirmam que os reis merovíngios, desde o seu fundador, Meroveus, até Clóvis (que se converteu ao cristianismo em 496 logo após salvar a igreja de Roma da extinção) eram «reis pagãos do culto de Diana». Certamente que é difícil conciliar esta afirmação com a ideia de que eles descendiam de Jesus ou de uma tribo judaica.
Outro exemplo desta curiosa seletividade, por parte de Baigent, Leigh e Lincoln, é o «documento Montgomery». Segundo estes autores, este documento é «uma narrativa que emergira» entre os arquivos pessoais da família Montgomery e que um membro desta família partilhara com eles. A data da sua origem é incerta, mas a versão que lhes foi apresentada é do século XIX. Para eles, o valor deste documento residia no fato de que, em essência, ele apoiava as teorias avançadas em The Holy Blood and The Holy Grail, embora, claro, não pudesse ser considerado prova delas. Provou, pelo menos, que esta ideia – que Jesus era casado com Maria Madalena – já era conhecida, pelo menos, um século antes de eles começarem a sua investigação.
O documento Montgomery narra a história de Yeshua ben Joseph (Jesus, filho de José), que era casado com Maria de Betânia (a figura bíblica que muitas pessoas consideram ser a mesma que Maria Madalena). Como consequência direta de uma revolta contra os romanos, Maria é presa e só é libertada porque está grávida. Depois, foge da Palestina e acaba por chegar à Gália (que é hoje a França), onde dá à luz uma filha (Sarah).
Embora seja fácil compreender o motivo por que o documento Montgomery foi aproveitado por Baigent, Leigh e Lincoln como suporte para a sua hipótese, é estranho que não tenham atribuído maior importância a certos aspectos da história. Nesta narrativa, Maria de Betânia é descrita como «uma alta sacerdotisa de um culto feminino»; tal como a veneração dos merovíngios à deusa Diana, isto acrescenta à história uma feição distintamente pagã que é difícil conciliar com o conceito de que o Priorado está principalmente preocupado com a continuação da descendência do rei judaico David – a qual inclui Jesus.
Curiosamente, o moderno Priorado não confirmou nem desmentiu a hipótese de The Holy Blood and The Holy Grail – e mais uma vez se levantam suspeitas. Pode o Priorado estar se divertindo conosco?
Uma coisa se tornou muito clara para nós: a ambição motivadora do Priorado não é puramente o poder político que Baigent, Leigh e Lincoln lhe atribuem. Continuamente, os arquivos mencionam pessoas – quer entre os verdadeiros grão-mestres quer entre os associados do Priorado – que não são essencialmente políticos, mas ocultistas. Por exemplo, Nicolas Flamel, grão-mestre entre 1398 e 1418, era um mestre alquimista. Robert Fludd (1595-1637) era rosacruz e, mais próximo do nosso tempo, Charles Nodier (grão-mestre entre 1081-1844) foi uma grande influência, que inspirou o renascimento do ocultismo moderno.
Mesmo Sir lsaac Newton (grão-mestre entre 1691-1727), atualmente mais conhecido como cientista e matemático, era um alquimista e um hermético e ocultista devotado e, certamente, possuiu cópias, profusamente anotadas, dos manifestos rosacruzes. Há também, evidentemente, Leonardo da Vinci, outro gênio que os modernos interpretam mal, considerando a sua viva inteligência apenas como fruto do pensamento materialista. De fato, como vimos, as suas obsessões provieram de outras fontes e tomaram-no um candidato ideal à lista dos grão-mestres do Priorado.
Curiosamente, apesar de reconhecerem os interesses esotéricos de muitas destas pessoas, Baigent, Leigh e Lincoln parecem não avaliar o total significado das suas obsessões. Afinal, em muitos destes casos, o ocultismo não era um simples passatempo ocasional, mas era, de fato, o principal centro de interesse das suas vidas. E a nossa experiência provou que os indivíduos relacionados com o moderno Priorado também praticam o ocultismo e o hermetismo.
Assim, qual o possível segredo (CONHECIMENTO SECRETO) podia ter atraído tantas das mais brilhantes mentes esotéricas mundiais, durante tanto tempo, admitindo que é improvável que tivesse sido a inverosímil e ilusória história merovíngia? Por mais convincente e pioneiro que The Holy Blood and The Holy Grail possa ter sido, a sua explicação dos objetivos e razões do Priorado é basicamente insatisfatória.
É evidente que alguma coisa se passou e se passa, a qual, dado o enorme montante de tempo, pessoas e de energia que parece ter sido consumido, ao longo dos séculos, dificilmente pode ser relativa apenas à legitimidade da monarquia francesa. E, seja ela qual for, deve ser tão ameaçadora para o status (n.t. para o FALSO sistema de crenças, o paradigma atual) quo que, mesmo depois do Século das Luzes,“ELA” teve de continuar a ser mantida secreta, a ser cautelosamente guardada por uma rede oculta de iniciados.
No princípio da nossa investigação sobre Leonardo e o Sudário de Turim, vimo-nos confrontados, repetidas vezes, com a inevitável sensação de que existe um verdadeiro segredo, que tem sido cuidadosamente guardado pelos poucos iniciados neste conhecimento. A medida que as nossas investigações prosseguiam, não podíamos afastar a suspeita de que os temas, que tínhamos detectado na vida e na obra de Leonardo, eram muito semelhantes aos temas que tínhamos discernido no material divulgado pelo Priorado. E, seguramente, valia a pena comprovar as suspeitas de que estes mesmos temas também estavam entrelaçados na obra de Jean Cocteau.
Já descrevemos o mural daquele artista, que se encontra na igreja de Notre-Dame de France, em Londres. Mas que relevância têm as suas imagens, notavelmente peculiares, para a obra de Leonardo, muito anterior, e para algum suposto movimento esotérico, oculto e hermético – e mesmo herético?
A ligação mais óbvia com a obra de Da Vinci é o fato de o artista se ter auto-retratado, afastando o olhar da cruz. Leonardo, como já referimos, representou-se a si próprio, deste modo, duas vezes, pelo menos – na Adoração dos Magos e na Última Ceia. Considerando a expressão do rosto de Cocteau, que sugere um profundo constrangimento perante toda a cena, não é uma concessão demasiado exagerada encontrar a mesma indiferença na violência com que Leonardo se afastou da Sagrada Família na Adoração.
No mural de Cocteau, vemos o homem crucificado apenas das coxas para baixo, o que implica alguma suspeita quanto à sua verdadeira identidade. Como vimos, na Última Ceia de Leonardo, a estranha ausência total de vinho parece implicar uma séria dúvida acerca da natureza do sacrifício de Jesus: aqui, o artista vai mais longe, ao não representar Jesus. Muito semelhante, também, é o uso da forma de um M enorme – na obra de Cocteau, ele liga as duas mulheres pesarosas, presumivelmente a Virgem Maria e Maria Madalena. E, de novo, podemos supor que é esta última que vemos afastada da figura de Jesus. Enquanto a Virgem Maria olha para baixo, chorando, é a mulher mais nova que está voltada de costas para Jesus.
Na Última Ceia de Leonardo, o M liga Jesus ao suspeitosamente feminino «S. João» – e esta «Senhora M» (de Cocteau) também está o mais possível afastada dele, enquanto, ao mesmo tempo, parece estar próxima.
O mural de Cocteau também contém simbolismo que, uma vez conhecidas as preocupações do Priorado de Sião, está explicitamente ligado a elas. Por exemplo, os dados que os soldados estão a lançar mostram cinquenta e oito pintas(58) – e este é o número esotérico do Priorado. Aos pés da cruz, a rosa vermelho-azulada, extraordinariamente grande, é uma clara alusão ao movimento Rosacruz que, como veremos, tem ligações estreitas com o Priorado e, certamente, com Leonardo (n.t. e com o conhecimento da verdade oculta).
Como já vimos, os membros do Priorado acreditam que Jesus não morreu na cruz, e algumas das suas facções defendem que uma vítima substituta sofreu o que lhe estava destinado. A julgar apenas pelas imagens deste mural, podíamos ser tentados a pensar que estas eram as opiniões pessoais de Cocteau. Por exemplo, não só não vemos o rosto da vítima como há a inclusão de uma figura – que não é usual associar à cena da Crucificação. É o homem que se encontra à extrema-direita, cujo único olho visível tem a forma inconfundível de um peixe – é, certamente, uma alusão ao primitivo código cristão de «Cristo». Assim, quem se espera que seja este homem com os olhos em forma de peixe? À luz do conceito do Priorado, de que Cristo nunca foi morto na cruz, não podia ser que esta figura extra fosse o próprio Jesus? Foi o suposto Messias, de fato, testemunha da tortura e da morte de um substituto? Se isto fosse verdade, podíamos imaginar as suas emoções.
Também nos murais de Leonardo e de Cocteau vemos a Senhora M – em ambos os casos, certamente, Maria Madalena. Assim, aquilo que conhecemos das crenças do Priorado – que ela era casada com Jesus – explicaria o motivo por que ela assistiu à última Ceia, sentada à direita do marido e por que – como sua «outra metade» – ela usava vestes que eram a imagem inversa das de Jesus (13/31=44=8).
Embora nos tempos medievais e do primitivo Renascimento existisse uma tradição, pouco conhecida, a de representar Madalena na última Ceia, Leonardo fez saber que, na sua versão, a personagem sentada à direita de Jesus era S. João. Por que decidiu ele iludir desta maneira? Era este, talvez, um modo sutil de dar às suas imagens um poder subliminar acrescentado? Afinal, se o artista diz que é um homem e a nossa mente nos diz que é uma mulher, é provável que a confusão nos obrigue a continuar a refletir sobre a imagem, a um nível inconsciente, durante muito tempo.
Tanto no mural de Leonardo como no de Cocteau, Madalena parece estar a exprimir, em silêncio, as suas dúvidas sobre o suposto papel de Jesus, através da sua linguagem corporal. Era ela, de fato, tão íntima de Jesus que conhecesse a verdadeira história? Era Madalena, de fato, a esposa de Jesus e, portanto, parte interessada na informação interna sobre o verdadeiro resultado da Crucificação? É por isso que ela se está se afastando?
O papel de Madalena está astuciosamente – mesmo que subliminarmente – realçado na Última Ceia, mas a maior obsessão de Leonardo parece ter sido com essa personagem trágica do Novo Testamento, S. João Batista. Se ele foi, de fato, membro do Priorado de Sião – e dado o interesse pela descendência de Jesus que lhes é atribuído -, esta obsessão com Batista parece um tanto complicada. Está ela em conformidade com os interesses do Priorado de Sião?
Giovanni (João em italiano), o nosso misterioso informador, deixou-nos com esta intrigante e exasperante pergunta: «Por que os grão-mestres desta sociedade são sempre chamados de João (ou Joana, se mulher)?» Nessa altura, consideramos esta pergunta como uma espécie de alusão semivelada à escolha do seu próprio pseudônimo e concluímos que ele não ocupava uma posição secundária. Mas, de fato, ele estava a chamar-nos a atenção para uma outra questão, muito mais significativa.
Apesar de os grão-mestres do Priorado serem conhecidos na organização como «Nautonnier» (timoneiro), eles também adotam o nome «Jean» (João) ou Jeanne (Joana), se são mulheres. Leonardo, por exemplo, figura nas suas listas como Jean IX. Vale a pena frisar que, por estranho que possa parecer numa antiga ordem cavaleiresca, o Priorado sempre reclamou ser uma sociedade secreta com igualdade de oportunidades (entre os sexos, diferentemente da maçonaria…), e quatro dos seus grão-mestres foram mulheres. (Hoje, uma das seções francesas do Priorado está sob o controle de uma mulher.) No entanto, esta política (A igualdade entre HOMEM e MULHER) é totalmente consistente com a verdadeira natureza e objetivos do Priorado – tal como os viemos a entender.
As preocupações do Priorado são indicadas pelos títulos usados na sua hierarquia organizativa. Segundo os seus estatutos, abaixo do Nautonnier há um grau formado por três iniciados, chamado «Prince Noachite de Notre Dame», e a este segue-se um grau, formado por nove membros, chamado «crisé de Saint Jean», ou «Cruzado de São João» (este último surge simplesmente como «Condestável» nas últimas versões dos estatutos).
Existem mais seis graus, mas os três primeiros, que compreendem os treze membros da mais alta hierarquia, formam o corpo dirigente. Coletivamente, este corpo dirigente é conhecido como Arch Kyria – a última palavra, KYRIA em grego, é uma designação respeitosa de mulher, o equivalente ao português «senhora». Especificamente, no mundo helenístico dos primeiros anos antes da era cristã, era um epíteto da deusa ÍSIS.
O primeiro grão-mestre da sociedade era, devemos dizê-lo, um verdadeiro João – Jean de Gisors, um fidalgo francês do século XII. Mas o verdadeiro enigma reside no fato curioso de que o seu título do Priorado foi, na verdade, «Jean II». Como divagam os autores de The Holy Blood and The Holy Grail:
Uma questão importante, evidentemente, era saber qual João. João Batista? João Evangelista – «o Discípulo Amado» do Quarto Evangelho? Ou João, o Divino, autor do livro da Revelação-Apocalipse? Parecia que tinha de ser um destes três… Quem foi, então, Jean I?
Outra ligação a «João» que desperta reflexão é a mencionada em Rennes-le-Château: capitale secréte de l’histoire de France (1982) de Jean Pierre Deloux e Jacques Brétigny. Os dois autores são conhecidos por estarem intimamente ligados a Pierre Plantard de Saint-Clair – por exemplo, faziam parte da sua entourage quando Baigent, Leigh e Lincoln o conheceram, nos anos 80 – e ele, certamente, deu uma enorme contribuição para o livro. Uma clara propaganda do Priorado, o livro explica como a sociedade secreta se formou. (Deloux e Brétigny também escreveram artigos relativos ao Priorado de Sião, na revista L’ Inexpliqué – a versão francesa de The Unexplained (O Inexplicável) – que, segundo algumas pessoas, foi lançada e financiada pelo Priorado.
A ideia primordial era, segundo se afirma, formar um «governo secreto,» tendo Godefroi de Bouillon – um dos líderes da Primeira Cruzada – como seu inspirador. Na Terra Santa, Godefroi se deparou com uma organização (n.t. secreta) chamada aIGREJA DE JOÃO e, como resultado, «formou um grande desígnio». «Pôs a sua espada ao serviço da Igreja de João, essa Igreja esotérica e iniciadora que representava a Tradição. A Igreja que baseava a sua primazia no Espírito.» Foi a partir deste grande desígnio que se formaram tanto o Priorado de Sião – a organização que chama sempre «João» aos seus grão-mestres – como a ordem dos CAVALEIROS TEMPLÁRIOS.
E, como diz Pierre Plantard de Saint-Clair, por intermédio de Deloux e Brétigny: Assim, no princípio do século XII, estavam reunidos os meios, temporais e espirituais, que vieram a permitir a realização do sonho sublime de Godefroi de Bouillon; a Ordem do Templo seria o braço armado da Igreja de João e o porta-estandarte da primeira dinastia, as armas que obedeciam ao espírito de Sião.
A consequência deste fervoroso «joanismo» deveria ser um «renascimento espiritual» que «voltasse a Cristandade às suas origens».
Apesar da sua óbvia importância para o Priorado, a ênfase em «João» permaneceu extremamente obscura – no princípio desta investigação, nem sabíamos qual João era tão venerado e, muito menos, o POR QUÊ ?. Mas qual é a razão desta obsessão? Por que não nos indicam a QUAL JOÃO estão se referindo? E por que deveria a veneração (mesmo que extrema) de qualquer dos santos de nome João começar por ameaçar precisamente as raízes do catolicismo romano (n.t. este sim, uma heresia completa)?
É possível, pelo menos, supor a que João o Priorado se reteria, se a obsessão de Leonardo com Batista puder servir de orientação. Contudo, como vimos, a ideia do Priorado sobre o papel de Jesus dificilmente era ortodoxa, e parece absurdo que dispensasse esta veneração ao homem que, alegadamente, apenas era importante como precursor de Jesus. Será possível que o Priorado, tal como Leonardo, venere secretamente João Batista acima do próprio Jesus?
É um conceito muito extravagante. Se existissem quaisquer razões para acreditar que Batista foi superior a Jesus, então as repercussões seriam inconcebivelmente traumáticas para a Igreja. Mesmo que o conceito «joanino» se baseasse num equívoco, mão se pode duvidar dos efeitos que esta crença teria se fosse mais amplamente conhecida (caso fosse aceita). Seria quase a heresia final – e os Arquivos Secretos acentuam, repetidamente, o caráter anti-clerical dos descendentes merovíngios e do seu possível encorajamento da heresia. O Priorado está interessado em transmitir a ideia de que a heresia é uma coisa boa, por alguma razão específica própria.
Compreendemos que a suposta heresia baptista tinha espantosas implicações e que, se continuássemos a investigar o Priorado, teríamos de nos confrontar, em primeiro lugar, com a questão de João Batista, embora, no início, não estivéssemos convencidos de que encontraríamos qualquer prova que apoiasse a heresia. Naquele momento, tudo o que tínhamos como prova das ideias do Priorado acerca de Batista era a manifesta obsessão de Leonardo com ele e o fato de o Priorado chamar (n.t. apenas de) «João» aos seus grão-mestres. Sinceramente, não tínhamos, então, qualquer esperança verdadeira de encontrar algo mais concreto que isso, mas, à medida que o tempo passava, iríamos descobrir provas muito mais sólidas de que o Priorado, de fato, fazia parte dessa tradição «joanina».
Com ou sem provas a apoiá-la, esta heresia conseguiu, mesmo assim, ser «acreditada» por gerações de membros do Priorado. Mas fazia ela parte, pelo menos, do grande segredo que se julga que eles possuem e guardam tão tenazmente?
A outra figura do Novo Testamento que tem enorme significado para o Priorado é, como vimos repetidamente, Maria Madalena. Os autores de The Holy Blood and The Holy Grail explicaram que a sua particular importância reside unicamente no (alegado) fato de ter casado com Jesus e ser a mãe dos seus filhos. Mas, considerando a admiração, menos que total, do Priorado por Jesus, esta explicação parece fraca.
Para aquela organização, Madalena parece ter alguma importância, por direito próprio, e o próprio Jesus é quase irrelevante – na história do «documento Montgomery», por exemplo, o seu papel limita-se a ser o pai do filho de Madalena e não desempenha qualquer outro papel no resto da narrativa. Poder-se-ia ir ao ponto de dizer que, mesmo sem Jesus, havia algo nesta mulher que a tornava de suprema importância.
Na continuação das nossas investigações, conseguimos contatar com Pierre Plantard de Saint-Clair e fazer-lhe algumas perguntas acerca do interesse do Priorado em Maria Madalena. Recebemos uma resposta do secretário de Plantard, Gino Sandri – um italiano que vive em Paris -, a qual, embora curta e concisa, era, todavia, sugestiva do famoso sentido malicioso do Priorado. Nela, Sandri dizia que podia ser possível ajudar, mas «talvez voces já tenham informação sobre este assunto?» – era, claramente, uma «piada» maliciosa sobre alguma coisa que ele sabia a nosso respeito, mas o elogio indireto deu-nos ânimo.
Parecia estar sugerindo que já tínhamos toda a informação que precisávamos conhecer – mas que competia a nós compreendê-la. Mas a carta de Sandri escondia ainda outra nota de malícia: embora trazendo o carimbo de 28 de Julho, a carta estava datada de 24 de Junho – o Dia de S. João Batista.
Para um leigo, qualquer ligação particularmente esotérica entre Maria Madalena e João Batista é uma questão de fantasia, porque os textos evangélicos conhecidos não registram que eles se tivessem conhecido. Contudo, aqui, temos um segredo aparentemente antigo que implica – e venera – ambos, e não de uma maneira vaga. Que havia nestas figuras do século I que assegurou esta tradição duradoura, embora «herética»? Que poderiam eles ter representado que fosse tão perturbador para a Igreja?
Como se pode imaginar, era muito difícil saber por onde começar. Mas, onde quer que investigássemos a história de Madalena, uma área, que ficava consideravelmente mais próxima de nós do que Israel, continuava a surgir como sendo importante. O Priorado sublinhava particularmente a lenda que a trouxe para o Sul da França, após a ressurreição de CRISTO, portanto, era ali que tínhamos de ir, para descobrir por nós próprios se esta história era apenas uma invenção medieval que, como o Sudário de Turim, se destinava a atrair um lucrativo comércio de peregrinações.
Mas havia, desde o princípio, alguma coisa especialmente fascinante na ligação desta enigmática figura do Novo Testamento com aquela determinada área, algo que ultrapassava estas considerações mercenárias. Decidimos investigar o segredo de Madalena no seu próprio terreno.
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